
17/06/2025
Um dos principais símbolos alimentícios do Cone Sul do continente americano é a erva-mate. Seu consumo remonta aos povos nativos, como os Guarani, e é difundido nos estados do Sul e do centro do Brasil, além de países como a Argentina, o Uruguai e o Paraguai.
O Brasil é o maior produtor mundial da planta, com quase 750 mil toneladas em 2023, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Porém, um estudo conduzido por pesquisadores da Unesp mostra que o processo de mudanças climáticas poderá alterar, nas próximas décadas, as condições para o cultivo da erva-mate em todo o continente, e que os produtores devem se preparar desde já para essa nova realidade.
Embora não seja uma commodity de demanda global como o café, a erva-mate possui grande relevância social para a América do Sul, servindo de matéria-prima para o preparo de bebidas tradicionais, como o chimarrão e o tereré, e contribuindo para a subsistência de populações agrícolas regionais. Também é empregada pelas indústrias alimentícia, farmacêutica e de cosméticos devido às suas propriedades nutricionais e medicinais.
A América Latina, por suas suas condições climáticas, concentra a produção mundial da planta, e quase 50% dela vem do Brasil. Em segundo lugar está a Argentina, com 42%, e em terceiro o Paraguai, com 9%, segundo dados de 2020 da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).
Especialista na área de agrometeorologia, Glauco de Souza Rolim, docente do Departamento de Ciências Exatas da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Unesp, é um dos pesquisadores responsáveis pelo novo estudo, que envolveu também profissionais do Instituto Federal do Sul de Minas (IFSULDEMINAS) e do Instituto Federal do Mato Grosso do Sul (IFMS).
O grupo examinou o zoneamento climático da erva-mate (Ilex paraguariensis) e projetou os efeitos das mudanças climáticas na disponibilidade de áreas aptas para o cultivo da planta nas próximas décadas.
Os resultados foram preocupantes. De acordo com o estudo, quando se considera o pior cenário climático no final do século, apresentado no último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), a área apta para o cultivo nos quatro principais países produtores da erva —Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai— será reduzida drasticamente, passando de 12,25% para apenas 2,2% do território somado dos quatro.
Os dados foram apresentados em um artigo publicado na International Journal of Biometeorology.
Não que este problema ameace apenas a erva-mate. No ano passado, Rolim e outros colaboradores se dedicaram à produção do café, apontando a possibilidade de perda de mais de 50% das áreas propícias para o cultivo do grão até 2080.
"O grande desafio do século 21 é a adaptação da agricultura às mudanças climáticas", diz Rolim. "O panorama mundial é desafiador e o homem ainda está fazendo pouco a respeito. O que vemos, de forma geral, é a diminuição das áreas produtivas, efeitos climáticos extremos adversos, tendência de aumento na temperatura e diminuição das chuvas", afirma.
O zoneamento climático é um instrumento relativamente comum na produção agrícola, capaz de ajudar na identificação de regiões e de períodos do ano favoráveis para o plantio, nos quais o risco de perdas causadas por eventos climáticos adversos é menor.
Para fazer o levantamento da erva-mate, os pesquisadores utilizam dados climáticos como temperatura, índices de precipitação, informações sobre o perfil do solo e levantamentos das características fisiológicas da planta.
A produtividade e a qualidade da erva-mate estão intimamente ligadas às condições climáticas locais. Estudos apontam que a planta se desenvolve melhor em regiões com temperaturas médias anuais entre 15°C e 22°C, e precipitação pluvial anual superior a 1.200 mm.
"A erva-mate é uma planta tropical, portanto é muito sensível, por exemplo, a geadas. Durante o seu ciclo produtivo, se houver um único dia com geada, pode ocorrer uma quebra considerável na produção", explica Rolim. "Ao mesmo tempo, temperaturas muito elevadas reduzem a taxa de desenvolvimento da planta."
As projeções climáticas usadas pelos pesquisadores no artigo tomaram como referência o modelo CMIP6, instrumento que serviu de base para o último relatório do IPCC e que fornece estimativas das mudanças climáticas para quatro períodos (2021-2040, 2041-2060, 2061-2081 e 2081-2100) e em quatro cenários diferentes (um otimista, dois intermediários e um pessimista).
Esses cenários variam de acordo com as estimativas sobre a capacidade da sociedade de adotar medidas para, efetivamente, reduzir a quantidade de gases de efeito estufa na atmosfera.
Ao realizar o zoneamento climático atual dos principais países produtores da erva-mate, o estudo constatou que apenas 12,2% da área total dos quatro países é propícia para o cultivo da planta atualmente. Isso corresponde a aproximadamente 1,5 milhão de km², com destaque para a região Sul do Brasil, cuja área é quase integralmente (96,7%) favorável para essa cultura.
A reportagem na íntegra pode ser lida na Folha de S. Paulo

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