
27/11/2025
Um atrás do outro. Nas duas semanas da COP30, a conferência da ONU que discute mudanças climáticas, jornalistas foram convidados quase todos os dias para acompanhar anúncios relacionados ao mercado de carbono, inclusive por atores até então pouco envolvidos nesse setor, como bancos tradicionais e seguradoras.
Novos projetos, novas empresas, novas concessões, novos produtos —foram tantos anúncios que calcular a quantidade exata se tornou uma tarefa difícil. A Folha contabilizou ao menos 11 de grande relevância.
O volume chama atenção não só pelo curto período de tempo em que os eventos foram feitos, mas principalmente porque o mercado voluntário de carbono florestal ficou em banho-maria nos últimos meses à medida que a animação das empresas para compensar suas emissões parecia ter se acalmado. Escândalos também minaram o setor.
Nesse mercado, empresas criam projetos em florestas, como a amazônia, para restaurar áreas degradadas ou conservar regiões ameaçadas de desmatamento. Esses esforços levam à geração de créditos de carbono, que são comercializados com grandes poluidores que querem compensar suas emissões. Um crédito equivale a uma tonelada de carbono absorvida ou que deixou de ser emitida na atmosfera.
Mas o período de pasmaceira parece ter ficado para trás nessa COP. Na sede de anunciar novas iniciativas durante a conferência, países, governos, bancos, ONGs e companhias privadas escolheram o mercado de carbono como vitrine de suas operações sustentáveis.
Os governos de Pará e Amazonas, por exemplo, anunciaram concessões de áreas da floresta amazônica para desenvolvedoras de crédito de carbono. O primeiro já havia organizado um leilão neste ano, mas aproveitou a conferência para lançar junto com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) um instrumento financeiro que diminuirá os riscos do modelo. A cerimônia contou com a presença do governador Helder Barbalho (MDB) e da ministra do Planejamento, Simone Tebet.
O governador amazonense, Wilson Lima (União), seguiu a mesma linha e lançou na COP30 uma concessão para que o setor possa cuidar de uma unidade de conservação do estado em troca de gerar créditos de carbono com o projeto. O anúncio foi feito mesmo após o Ministério Público Federal pedir a suspensão da licitação.
Governos de Mato Grosso e Goiás também anunciaram parcerias nesse mercado. Ambos avançaram nas negociações com a Emergent, organização estrangeira responsável por conectar estados a compradores de créditos de carbono. Nesse modelo, os créditos são gerados a partir da redução de desmatamento nos estados em relação a uma base pré-determinada.
Já o governo federal, por meio do Serviço Florestal Brasileiro, aproveitou a COP30 para lançar uma concessão que o órgão preparava desde o ano passado. No caso, uma área degradada da Floresta Nacional do Bom Futuro, em Rondônia, será entregue a uma desenvolvedora de projetos responsável por restaurá-la e comercializar créditos de carbono por 40 anos.
"Essa retomada vem muito do movimento do Brasil, que quer mostrar o trabalho do país nessa agenda. E os estados querem se posicionar como parte da solução e não do problema, principalmente os estados amazônicos ou os que têm agronegócio muito forte, como Mato Grosso", diz Lauro Marins, diretor de soluções digitais e consultoria da WayCarbon.
E, nessa estratégia brasileira, até atores incomuns no mercado resolveram dar as caras na COP30.
O Bradesco, por exemplo, se uniu ao BNDES para anunciar a criação de uma nova certificadora de créditos de carbono, parte do mercado hoje dominada por duas empresas alvo de contestações em todo o mundo, inclusive no Brasil. A ideia dos bancos é abrasileirar o processo de verificação dos créditos, ainda que isso passe por um longo processo de credibilidade —peça-chave em um mercado voluntário sem a regulamentação do governo.
Ainda no setor bancário, a Caixa disse ter compensado, por meio de um projeto de resíduos sólidos no Rio de Janeiro, todas as emissões de gases de efeito estufa da COP30, incluindo o transporte aéreo e marítimo de delegações oficiais. O banco também lançou uma iniciativa para que credenciados da sociedade civil na conferência compensem suas próprias emissões por meio da compra de créditos.
Já o Banco do Brasil anunciou a criação de uma mesa de comercialização em que desenvolvedoras poderão hospedar seus créditos de carbono e negociar com empresas que querem compensar suas emissões. Os créditos virão de projetos apoiados pelo banco, que já financia o setor há alguns anos. A B3, a Bolsa de Valores de São Paulo, tem iniciativa semelhante.
O interesse das instituições financeiras passa pelo mercado regulado de carbono, aprovado pelo Congresso no ano passado e hoje em processo de regulamentação pelo Ministério da Fazenda. Nesse mecanismo, empresas precisam cumprir metas de redução de emissões estipuladas pelo governo e, em caso de descumprimento, devem comprar cotas lançadas no mercado por empresas com resultados melhores do que a meta.
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